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Sonhava que o beijava. Ou que deixava que ele a beijasse. Misturava-se tudo num sonho acordado ou então, mesmo antes de adormecer, já de olhos fechados e a inventar diálogos entre ele e ela, depois apenas um murmurio, o rosto alçado pronto para receber nos lábios os lábios dele. Ele havía de a beijar docemente, devagar, primeiro a olhá-la nos olhos, depois os dois de olhos fechados e ainda assim ela vê-lo-ía a beijá-la. E sería bom. E querería mais. E ele não passaría sem os beijos que se oferecíam naquela imaginação e que só existem quando ainda não foram dados.
Quente. Húmido. Macio. É disso que se recorda, do resto à volta não tem lembrança, onde foi e como começou também não. Só quente, muito quente até, como se escaldasse na barriga. Ficou sempre com essa sensação. E também de se encontrar sózinha sem mais ninguém, mas não era naquele sitio era no mundo, no universo, todas as estrelas e galáxias tudo desaparecido, como se estivesse debaixo de um lençol branco muito macio, os pés um palmo acima da terra e descalça. Descalça. Quente. Orvalhada pelo beijo.
Já te contei alguma vez a história do beijo? Não. Então chega ao pé de mim, aproxima os teus lábios para que os meus lhe segredem esta história de encantar.
Estranho íman o que atrai a boca para outra, apenas pelo sentido de boca, lábios, lingua, sem necessidade de outro sentido que não o do prazer primeiro de beijar, sentir todo o corpo numa boca, bizarro desejo que consola quando as bocas se juntam e tomam o paladar excitado das pimentas no húmido consolo do beijo. O beijo pelo beijo. O orgasmo do beijo.
Anda dá-me um beijo, e ela fugia no riso mais do que na vontade de dizer não. Era tudo um jogo, um jogo encantado em que a qualquer momento ele a agarrava e a prendía e ela fingindo que não quería deixava tomar-se nos braços, de olhos fechados e boca inquieta na ansiedade do gosto sentido, repetido, dá-me um beijo.
Depois de tudo trocado, entregue, lembrado os instantes como distâncias longínquas, o corpo agora afastado pelo fosso do ponto final, o que parecera grandioso ficava pequeno nos objectos que havíam perdido o valor, todo um brilho que enganara os tolos sobre um ouro fingido. Nada é para sempre, pensaram. Mas não o disseram, retiveram essa mágoa para si como um respeito que sela a caixa que se entrega nas mãos do outro. Foi por isso que nem um beijo mais ofereceram na despedida.
De todas as palavras que deitou na carta, sentidas, comovidas, apaixonadas, nenhuma tinha a força igual da que no singular enviava em despedida singela quase a roçar o despercebido. E no entanto, podíam as folhas seguir na ausência de outro verbo que aquele beijo era o bastante para encher e insuflar o envelope de tudo quanto guardava no peito. Um beijo e assinou.
Fica comigo para sempre, e nesta comoção aproximava o rosto do dele, as mãos presas num querer e num agarrar como se possível fosse segurar a vontade e o coração, fica comigo para sempre, sempre e quase lhe tocava a boca, dava para sentir o morno dos lábios, o hálito das palavras sofridas na antecipação das saudades da partida, fica, fica, diz que é para sempre e ele suado de tanto correr para o pedido dela respondeu-lhe um beijo.